quinta-feira, 28 de julho de 2011

Bar


Ele está sentado no bar. Toma o terceiro copo de cerveja, já tomou duas garrafas no outro bar antes de ser expulso. Acena para o garçom, mostra sua credencial. Isto é o suficiente para ter tudo o que deseja. Ainda está tentando chamar a atenção da garota de vestido branco e preto sentada com uns amigos atrás das mesas de sinuca. São três e meia da madrugada e eles cantam como se estivessem num parque fazendo piquenique ao meio dia. Um deles tem um violão e colabora com os tímpanos de todos presentes que não agüentam mais tanta gritaria por parte daqueles que discutem suas táticas de bilhar.
Meu alvo está se movendo, vai ao banheiro. Não vou segui-lo, não quero ser visto por ele. É fácil saber que ele só quer chamar a atenção da garota. Conseguiu, mas ela parece não querer cair em sua armadilha. A mesma de antes.
Ele a espera no banheiro e volta alguns minutos sabendo que ela não cairá em seu golpe. Sabe que precisará de mais lucidez. Agora vai ter que ser mais habilidoso para conseguir sua presa. Volta ao balcão e pede água. Bebe dois copos como se fosse um refugiado que acaba de chegar do deserto. Quero que ele saia logo, não quero ser visto por ninguém, ou teria feito meu serviço ali mesmo, no banheiro.
O rapaz do violão começa a tocar mais alto. Agora já é quase impossível ouvir a voz dos competidores de taco na mão. De fato eles estão prestando atenção na música. Música boa. Meu alvo observa a garota de vestido branco e preto como se fosse um caçador. Não tira os olhos dela nem mesmo quando toma água. Está vidrado. Parece que ele não sairá dali antes dela. Mas sua bexiga não aguenta e volta ao banheiro. Desisto de ser tão sutil, vou fazer agora o que vim fazer antes, sei que ele estará com a guarda baixa. Quem muito quer atacar uma alvo se esquece de defender-se, principalmente quando se sente tão superior. Ele pensa não cometer erros. Coitado, sua hora chegou, vai sofrer o que Lea também sofreu, mas sua dívida só será paga no inferno.
Todos estão olhando para o rapaz tocando sua bela música. Sigo meu alvo de perto, não o tiro de vista enquanto serpenteia entre os que estão no caminho. Ele entra no corredor que dá acesso ao banheiro, lá vejo uma das garotas que estavam no grupo da garota do vestido branco e preto. Ela saiu de uma porta logo após a passagem do meu alvo e agora na minha frente, me bloqueia a passagem, tenta me seduzir e seu perfume realmente é capaz disto. Pergunta pela minha pressa, ainda posso ouvir a música no salão, todos estavam hipnotizados por ela, mas eu não, eu tinha um objetivo.
A garota de perfume mágico tenta me segurar e de alguma forma consegue. Perdi meu alvo, perdi minha vingança por causa dela. Estou preso na parede ela me olha nos olhos enquanto seu aroma penetra minhas narinas e paralisa todo meu corpo. Ao fundo vejo a garota do vestido branco e preto sair da mesma cabine mictória que meu alvo havia entrado há pouco, mas ela estava diferente, na verdade seu vestido está diferente. Agora seu vestido é vermelho e preto. Um vermelho quase vivo. Sua pele está limpa, branca e fria como gelo. Passa por sua amiga e diz que já está feito. Sua amiga, de perfume mágico, diz que eu estou cheio e sai. A garota de vestido vermelho e preto achou isto perfeito e também sai. Estou livre para seguir em frente com o meu plano.
Ando pelo corredor com medo, dúvida, ódio e tédio no estômago. Isto tudo junto faz muito mal e por isso estou tão pesado. Sinto o assoalho afundando a cada passo que dou. Minhas mãos tremem antes de entrar na cabine mictória do meu alvo. Começo a me perguntar o que havia acontecido instantes antes, quando a garota que mudara de vestido estava aqui dentro ainda. Penso que isso era besteira e sigo em frente. Estou a duas portas da cabine-alvo, agora não posso mais recuar. Não tenho plano de fuga. Abri a porta da cabine com violência assim que me deparei em frente a ela. Como um tubarão desliguei meus sentidos principais apenas foquei-me em meu alvo. Retirei da cintura minha faca de caça, presente de natal que ganhei dela. Esfaqueei-o várias vezes. Meu objetivo estava alcançado, agora comecei a retomar meus sentidos. Não entendo o que vejo. Sem nenhuma reação ele aceitou meus golpes. Sou um assassino. Matei a sangue frio, ou não. Logo pessoas me encontram debruçado sobre o cadáver procurando uma explicação. Minha consciência volta e fico ainda mais confuso. Sou assassino, ou não? Para o público que saíra do transe musical sim, mas para mim? Minha alma está suja pelo desejo de ter matado, mas matei? Minhas mãos estão sujas de sangue, isso é tudo. O grupo de amigos que estava sentado atrás das mesas de sinuca desapareceu. Ninguém viu, só eu.

Le grand ennui


Há algum tempo venho tentando escrever algo para postar aqui, de fato isto tem me chateado bastante, pois não tenho obtido sucesso. Desde o meu acidente apenas postei um texto/mensagem e nada mais. Inventei várias desculpas a meus amigos que me perguntavam o motivo, mas nunca tive coragem de admitir meu fracasso na luta contra certas forças ocultas que imperam sobre meu ser fragilizado pelo tédio. Entreguei-me totalmente a uma rotina de ócio. Aqueles que mais de perto me acompanham têm ouvido de mim apenas o velho mantra entediante de uma pessoa que não pode fazer mais o que estava acostumado e o que deseja. Apesar de ter sofrido apenas uma fratura em minha perna esquerda, tenho vivido os meus dias como se algo muito mais importante tenha se ido ao chão junto do meu corpo naquela sexta-feira.
Não posso falar que só coisas ruins tenham acontecido comigo. Agora que recebi um certo impulso para começar a escrever seria desprezível da minha parte ficar lamentando apenas. Esses dias de clausura foram bastante úteis para mim, na verdade estão servindo como nenhum outro período da minha vida. Começo a acreditar naqueles ditados que falam sobre tirar algum tempo para refletir na vida e tal. De fato neste mês e meio abri meus olhos para várias coisas que andava fazendo errado. Descobri que estava confundindo muito meus colegas com amigos. Fui roubado e não posso falar que não suspeito de alguém acima de qualquer suspeita. Percebi como sinto falta dos meus amigos de verdade por perto e estou tendo uma visão mais clara de como eles estão se afastando de mim, e a culpa pode ser minha.
No meio de toda bagunça que tem acontecido, que não posso falar tudo ou minha pouca moral se esvairá com o vento pela janela aberta mais próxima de quem ler isto, encontrei uma pessoa que me fez reconhecer alguns valores que de fato os conhecia, mas fingia que fossem impossíveis para mim. Mudei-me para esta cidade por dois simples motivos: trabalho e independência. Sei que na verdade eles se completam, mas são nobres demais e por isso devem ser vistos separados. Mas nesta cidade encontrei mais do que isso. Encontrei uma pessoa que muito me tem ajudado. Não vou ficar horas escrevendo coisas que não façam sentido para ninguém a não ser para mim, só devo expressar o quanto me sinto grato por encontrar uma nova definição de amor com ela.
Assim, contudo, devo dizer que nestes entediantes 48 dias desde a queda coisas terríveis tenham me acontecido. Meu corpo tem sido um campo de testes para pragas, pois não tenho apenas a perna quebrada. Um tipo de alergia não identificada anda consumindo parte da minha pele. Também tenho enfrentado resfriados que parecem ter saído de meus pesadelos. Estes são meus companheiros noturnos que estão conseguindo levar a minha saúde mental para o mesmo lado da corporal. Chega de lamentar sobre tudo isso. Não entendo que aceitando estar na merda vou parar de reclamar, só estarei reclamando com menos ódio. Afinal estou entediado demais para isso.
(acabo de entender o porquê dos velhos decrépitos serem tão ranzinzas)

sexta-feira, 17 de junho de 2011

Secretum invenit




Ei! eu preciso te contar meus segredos, pois eles devem deixar de ser segredos, uma vez que eles ocupam muito espaço e quero este para guardar meus sonhos. Vou contá-los também, para ti, porque sinto uma necessidade absurda de dividir minhas experiências contigo. Não me faça passar por louco, não sou mesmo. Sou uma pessoa que sente muito a tua falta. Isso não é pecado, na verdade é uma obrigação. Mas atenção, antes de começar a expor minha vida e meus pensamentos, que podem ser a mesma coisa, peço-te que feche bem a porta, para que se ficar entediada tenha ainda que parar e pensar antes de sair do quarto.
Como sabes me mudei para outra vila. Aqui os camponeses são diferentes com regras sociais diferentes. Tu sabes que gosto de conhecer novos mundos, neste caso o que mais tenho aprendido é como dois mundos tão próximos podem ser tão diferentes. Aqui estou mais independente, para falar a verdade estou isolado, para sobreviver bem tive que me misturar, acabei me colocando em situações onde tive que me associar a outras pessoas, sabia que isso aconteceria, mas não imaginava a intensidade. Hoje estou, de fato, sendo apoiado e fazendo parte de um novo clã, no entanto estes não sabem nem nunca saberão a importância de vós. Não faço isso porque eles não merecem, de fato, hoje ensaio um amor conjugal, lindo e cheio de virtudes onde cada dia é um alegre recomeço e cheio de surpresas que me fazem sentir-me repleto de felicidades domesticadas. Faço isso porque sou egoísta e não quero dividir com mais ninguém as glórias alcançadas na temporada passada enquanto estava convosco.
Uma mudança importante aconteceu recentemente em minha vida, troquei meu cavalo, agora estou com um mais potente e que não exige mais tanto esforço da minha parte quanto o outro. É claro que troquei apenas um deles, mantenho ainda alguns para lazer assim que me recuperar. Sofri um pequeno acidente com meu novo alazão, por ser mais potente e rápido ainda não o consegui domar com tanta maestria como fiz com os outros, minhas habilidades devem ainda ser aprimoradas para este novo tipo de montaria. Estou superando o velo trauma por carruagens, poso até dizer que ele já faz parte do passado.
De fato, não são apenas os meus relacionamentos e montarias que estão se transformando aqui nesta vila, também meus planos. Começo a planejar o futuro diferentemente de quando estava aí, mas, é claro, levo sempre nas lembranças nossos momentos juntos. Ainda sinto por vós carinho extenso, lembro-me de quando dizia que não desejava muito voltar a mudar-me para cá, colocaste que por conta do meu signo que não é adepto a mudanças, concordo, mas ainda mais por fato de que aqui nesta terra as obrigações andam a devorar-me o que tinha de mais valioso, o tempo, de maneira a não me fazer permitir cumprir minhas promessas de reencontro. Isto fere-me na alma. Contudo, apesar de não postar aqui já a algum tempo, desejo de fato que este seja o nosso ambiente comum, onde possamos saber mais um do outro, eu neste sítio e tu no teu. Leremos um ao outro como se o mundo não mais existisse, apenas nossas lembranças e planos.
Sabeis pois que meus sentimentos por você ainda são tão grandes como o mar que não tem fim e fortes como o ciclone que não se tem como deter, amo-te um amor pueril, fraterno, indefectível. Jamais a esquecerei. Desejo, também, saber de sua vida e de teus planos.

domingo, 20 de março de 2011

Murs




Ele queria viajar para a longe desde cedo. Europa, Ásia, América do norte, Oceania ou África eram seus destinos futuros quando criança. Sabia que seu destino era viajar para longe dalí, só  não sabia o porquê. Quando criança, ainda, seus amigos o chamavam de louco, e como crianças que também eram, faziam coisas cruéis a ele. Sua resposta às agressões físicas e morais era sempre a mesma: silêncio, e cada vez mais vontade de largar toda aquela escória. Viveu assim por muito tempo. Para a maioria das pessoas a fase de transformações e conflitos é a adolescência, não para ele. Sua pior fase sem dúvida foi a infância. Naquele período era indefeso e só. Não era assim tão desprotegido porque de fato as pessoas lhe davam as costas, mas era assim por que não aceitava a ajuda de ninguém. As pessoas o enfraqueciam.
Quando chegou à puberdade e seus colegas começavam a ensaiar a vida amorosa, partindo pelas fantasias sexuais, seus traços de personalidade ficaram mais evidentes. Sua isolação era visceral, não aceitaria que qualquer pessoa se aproximasse. Caso contrário seria ríspido, pois havia sobre ele uma espécie de barreira que impediria qualquer avanço pessoal. Mas nesta fase, os hormônios contrariaram sua natureza pessoal. Passou a se incomodar por não ser observado. E isso se deu por conta de uma pessoa em especial. Essa fatalidade do destino fez com que suas defesas abaixassem e permitissem que outros seres penetrassem em sua carapaça invisível. Era esperto. Sabia que em uma boa pescaria era necessário capturar todo o cardume para que o peixe tão desejado caísse em sua rede. Só não sabia ele o que fazer depois. Não foi preciso descobrir o que fazer, pois jamais capturara sua presa, só o cardume.
Esse fato de deixar cair as defesas o deixou imune às aproximações indesejadas. Levou tudo numa boa, foi falso como pode. Até gostou disso. E assim que se percebeu, estava perdido sem seus planos de infância. A Europa, Ásia, África, Oceania e América do norte estavam muito distantes. Seus olhos já não alcançavam mais. Estava se conformando com sua vida recheada de pessoas que não o compreendiam. Pessoas que o julgavam por valores que desconhecia. E agora desprovido de sonhos, buscava adaptar-se. Morria lentamente para promover um renascimento sem sentido.
Sua adolescência também foi uma fase de transtornos. Diferente da maioria dos seres que conhecia, aprendera algo neste processo. Não teve ajuda e passou por transformações realmente profundas. Isso influencia em sua visão de mundo atual. Não entende certos valores que a sociedade tem. Será eternamente marcado por ter se exilado quando criança. Essa mutilação deixou marcas piores que as causadas por acidentes físicos que sofrera. Está eternamente deformado. Seus valores não se encaixam e cada vez mais isso o atormenta, pois precisa adequar-se. E isso gera nós em sua cabeça.
Seu equilíbrio está alterado, sua debilidade é crônica. Não tem consciência disso. É impossível ter noção do quanto é deslocado. Apenas sente os efeitos dessa estranha realidade que o cerca, contrastando com a que ele enxerga. Sabe, portanto que algo está errado, principalmente quando freqüenta ambientes onde é comum a troca daquilo que de fato desconhece o sentido. Mas comporta-se como se fosse um dos quais. Não sabe ao certo se todos estão fingindo como ele ou se de fato gostam daquela palhaçada. Finge gostar sem saber exatamente o porquê. Talvez goste de testar os limites de sua paciência ou alguns elementos daquilo tudo o agradam. Talvez apenas repita o mesmo erro cometido quando entrara em sua fase adolescente.
Acontece que para ele é muito complicado entender como as pessoas podem desenhar suas vidas com tanta facilidade. Será que realmente elas conseguem fazer isso, ou estão apenas  mentindo. Quando pensa nisso lembra-se de como era agradável permanecer entre suas paredes imaginárias, não se importando com o mundo que o cercava. Levando uma vida onde a observação despretensiosa era toda a que tinha. Hoje, viciado em ser social, sofre, ainda calado, mas já beira o seu limite. Sente falta do não sentir de antes. Lembra que está experimentando emoções muito facilmente descartáveis, e não sabe digerir as coisas assim tão rápido. Relembra que naquele momento em que se abriu pela primeira vez sua obnubilação o trancou para o lado de fora das paredes invisíveis e agora fica muito difícil achar a entrada.
De fato ele ainda busca aquelas viagens de antes, mas agora de maneiras diferentes. Obrigações entraram em seu caminho. Nada é mais tão simples. Agora ele deve lidar com números de pessoas muito maiores que antes. Deve tomar cuidado para que seus sonhos não o devorem ainda de dia. E se esforça bastante para não deixar a caixa se abrir completamente.

quarta-feira, 9 de março de 2011

Já chega!



Por que afinal a humanidade restringe tanto o direito de cultivar o prazer? Acredito que em algum país de cultura muito distante deva existir uma sociedade em que os homens e mulheres sejam dotados do poder de levar suas vidas livremente, sem as tolices sacerdotais dos deveres sociais. Como pode ser tão difícil estar próximo de sua realização profissional ou pessoal e ter tempo para desfrutar das duas? Estou bem longe delas, mas sinto que vivo em um túnel de sentido único onde não se pode ficar parado e caso queria serei esmagado por todos ao meu redor. Faço as coisas visando meu bem estar pessoal, mas cada vez mais que o procuro sofro pressão por não estar buscando sucesso profissional. Isso é tão tautológico, porque afinal nunca alcançaremos o último degrau desta escalada social infindável e enquanto humanos precisamos de diversão.
A busca por objetivos tem se confundido com competição. O alvo do homem não é mais ter uma bela casa, bela esposa (como se mulheres fossem objetos), belo emprego e porte físico atlético. Agora o homem busca ter o que pertence ao outro, ou melhor, busca ter algo melhor do que o outro. Não entendo a realidade feminina, mas não duvido que seja muito diferente. Estamos desperdiçando um tempo enorme movendo essa máquina capitalista enquanto perdemos as belas coisas que a natureza tem para nos oferecer. Até a humanidade tem muito mais a oferecer do que temos buscado aproveitar.
Poucos sabem realmente quais são os seus potenciais, pois buscam realizar o sonho de consumo dos pais. Pessoas que precisam se submeter a condições de trabalho desumanas para sobreviver, já que a ordem dos seus patrões é para que se trabalhe um pouquinho além do que já trabalha para conseguir aquele cargo superior e manter a cadência exploratória. Não falo em volta à era tribal, onde os homens se ajudavam e viviam sem nenhum conforto. Refiro-me a uma ideologia de respeito às leis humanas sobre a preservação do que resta de natureza dentro de nós.
A humanidade evoluiu ao ponto de digerir a ela própria e marginalizar seus excrementos, assim vive em uma latrina asquerosa chamada cidade grande. O capitalismo foi o grande responsável por isso. Doença viral surgiu como uma solução a outra situação degradante, mas com o passar do tempo se tornou força dominante, responsável por conflitos separatistas dos mais diversos propagando o preconceito e a intolerância. Estamos chegando a uma nova fase de deterioração humana, agora é hora de olharmos para o planeta e para as coisas viventes, mas não sem antes procurarmos nossas necessidades pessoais.
É comprovado pelo sorriso de uma criança que uma tarde no parque, no rio, na praia, na fazenda ou em qualquer lugar em que se tenha natureza faz bem. Também sei que projetos culturais como idas ao cinema, teatro ou shows musicais fazem efeito positivo à qualidade de vida. Depende mais de como as pessoas encaram as responsabilidades do que como as responsabilidades encaram as pessoas para se ter um bom padrão social. Não digo que seja necessário esquecer-se das dívidas, trabalhos e afins, mas que é importante saber que tudo o que precisamos é de uma vida mais simples para termos tranqüilidade e paz. Afinal devemos nos preocupar mesmo é com nossa mente e com nosso corpo, não nos aposentaremos deles enquanto estivermos por aqui.

Incurable



Johann tinha 19 anos quando seu ferimento começou a dar sinais de existência. Como era jovem pensou que um machucado daqueles não seria nada tão grave. Continuava a fazer as coisas que fazia sempre sem reparar como a ferida evoluía. Uma vez quando começou a doer ele deixou de tocá-la, sua forma de cuidar. Não durou muito e ela começou a inflamar. Teve que tratar. Buscou ajuda e descobriu o melhor jeito de cuidar dela. Começou a tratar dela. Pare ele seria uma experiência nova e um pouco dolorida.
Era muito jovem para ficar preso a algo assim por tanto tempo e logo tratou de livrar-se, mas não sem antes cometer certas displicências, as quais o farão ficar muito arrependido mais tarde. Ficou livre dos medicamentos já que a “pereba” estava indolor. Passou a desprezar o tratamento e ficou assim por alguns meses até que a ferida voltasse a doer. Buscou o remédio, mas desta vez não queria o mesmo cuidado. No entanto, depois de algum tempo percebeu que já podia viver tranquilamente, pois já teria assumido sua condição. Pensava que quando fosse necessário era só buscar o caminho de sempre. Deixou então os cuidados e foi aventurar-se por ai.
Passou bem por um ano, até perceber que seu pequeno machucado, de quando tinha 19 anos, evoluíra a algum tipo de doença agora. Sabe que só tem um tratamento para aliviar as dores pelo corpo. Tentou reaver o processo medicinal, sem sucesso, pois o mesmo já estava indisponível. Passou mal e tentou lidar com isso com métodos nada ortodoxos. Buscou isolamento para não contagiar alguém. Acabou se ferindo mais e seu estado ficou digno de pena, mesmo que não deixasse que percebesse seu real estado.
Mas Johann é forte e com o tempo percebeu que pode viver com essa doença. Ele conseguiu estabilizá-la a base de preparo físico e muito trabalho. Foi se adaptando e criou um tipo de resistência a suas dores. Isso não foi fácil, mas já conseguia sair e se divertir como antes. Sua cura não era possível sem o tratamento adequado, mas sua recente força de vontade devido a uns medicamentos alternativos o fez bem.
Pena que ninguém sabe como lidar com ele. E às vezes pessoas muito próximas acabam fazendo-o sofrer quando mostram sua ferida, e pior, metem mesmo o dedo mostrando que ele deve cuidar dela. Mas o grande problema é que para isso medidas dolorosas deverão ser tomadas, e ninguém exceto ele sabe o quanto isso pode ser doloroso. Ele deseja que as pessoas passem a cuidar de seus próprios cânceres.

Alto do delírio II


Recentemente postei aqui no blog que tinha feito uma trilha bem legal, que tinha visto um espetáculo de beleza natural no “Alto do delírio”, pois bem, disse que voltaria lá em breve e tiraria fotos. De fato não queria ter ido lá ontem, fui porque infelizmente algumas coisas não saíram como planejadas e... Mas o que importa é que fui lá e tirei algumas fotos, poucas, mas podem ser vistas no link abaixo.


Para quem quiser ir ver pessoalmente já informo logo que é preciso ter fôlego.

O drama de Alphonse



Alphonse é um homem metódico. Tem o costume de planejar tudo em sua vida, até as coisas mais triviais. Mesmo que não pareça, ele tem tudo sobre controle, ou pelo menos pensa ter. Conhece todos os seus amigos muito bem. E os divide em grupos, teme que se encontrem e se misturem. Sabe que caso isso aconteça ele vai ter muito trabalho mental definindo-os por afinidade e não por habilidades, como faz agora. Sua vida é tranqüila e programada. Sabe quando pode fazer as coisas e o que vai acontecer se ignorar algum detalhe. Às vezes, só para ter alguma surpresa proposital, deixa de fazer algo ou faz fora de hora. Os resultados destas traquinagens com seu planejamento o faz preparar-se para possíveis arbitrariedades esperadas para o futuro.
Não pense que ele não pode ser espontâneo. Engana-se quem pensa isso. O problema é que isso acontece apenas quando ele pode ser assim. Sempre que sente a necessidade de fazer alguma loucura procura uma boa ocasião em sua agenda e se prepara bem para isso. Sabe direitinho que tipo de espontaneidade pode praticar e saberá que está bem preservado. Na maioria das vezes ele planeja algo para si. Dificilmente envolve outras pessoas em suas programações, sabe o quanto são difíceis de organizar. Entende que pessoas são como variáveis matemáticas de fórmulas ainda não estabelecidas. Variáveis que dependem de muitas variáveis.
Uma bela tarde, observando a chuva e conjecturando junto aos seus botões como essa assimetria toda era desastrosa, Alphonse resolve projetar uma experiência. Verifica que para a chuva cair líquida depende de muitos fatores diferentes e que muitas forças diferentes são empregadas em todas as transformações e transporte das moléculas de água. Resolve então juntar elementos diferentes de sua vida. Sabe que boa parte destes elementos nem eram tão distantes, faz isso para não provocar um desastre. Planeja tudo muito bem, faz contatos, recorre a pessoas do passado somente para levar seu plano à frente. No fim se ocupa tanto com as árduas tarefas diplomáticas que em duas semanas tudo já estava acertado. O mais difícil era conseguir as máquinas humanas, mas isso estava garantido por palavras. Ele não confiava muito em palavras ditas, mas confiava que todas as pessoas tivessem seu mesmo comprometimento com elas.
Passado um mês tudo ainda estava em ordem para seu plano. As palavras firmavam-se no ar que saía da boca das pessoas com quem contava. Ele lembrava que agora faltava pouco para a culminância de seu projeto. Mas algo o afligia, talvez fosse a força das vozes de seus elementos recrutados esvaindo-se. Resolveu então checar os cabos que davam sustentação ao seu plano que era mais que um sonho. Neste momento repara que estão afrouxando e não trem ponto de nó. Então os deixa ir e concentra energias fortificando os restantes mais rígidos e confiantes. Logo ganha outros apoios inesperados. Algo está indo mal. Não gosta de surpresas que não foram planejadas, mas aceita.
Mal sabia ele que esse era o mesmo apoio que ceifaria suas esperanças na raça humana para projetos tão bem cuidados. Ele devia ter obrigado seus elementos a registrarem suas palavras em papel que pode ser cuidadosamente arquivado e não no ar que vira vento. Como seu instinto supôs aquele apoio surpresa não foi boa coisa. Ele trouxe o elemento que move as pessoas, o dinheiro. Agora ele perdeu seus elementos, pois não eram tão covalentes assim e dissiparam-se apenas com o esforço o oferecimento material. Entendeu então que sua experiência chegara a algum resultado.
Ele entendeu que planejar algo real sobre coisas resultantes de emoções não funciona. Entendeu que levar a sério palavras jogadas para seu agrado como farelo de pão aos peixes também não era certo. Entendeu que por mais forte e transcendental que sejam as idéias elas se dissolvem inertes aos caprichos materiais proporcionados pela efemeridade de uns poucos recursos financeiros. Por fim entendeu que não se deve competir com a ambição humana, pois ela é muito forte e o pobre Alphonse ainda não tem condições de competir contra.
De fato Alphonse conseguiu mais uma vez. Fez uma experiência e como programado acabou aprendendo algo. Saiu ileso do que seria para qualquer outra pessoa motivo para gerar rancor ou decepção. Felizmente ele sabia que em pessoas não se deve investir nenhum sonho de tanto valor. Só coisas efêmeras sobre coisas efêmeras. Pessoas são movidas por impulsos materiais, por isso são tão infelizes. Ele espera sair logo deste inferno.

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Idiossincrasia



Passava na frente daquela casa todo dia e sempre quis saber o que havia La dentro. Naquela manhã após desligar-se das coisas que já não faziam sentido para ele, resolveu entrar. Não havia nada de diferente no céu. Tudo normal como em um amanhecer de verão. A única coisa diferente naquele dia era a porta da casa aberta. Ele é curioso e por isso resolveu entrar. Também é inocente e não sabe que às vezes é necessário deixar as portas abertas para deixar o ar fluir. Mesmo quando o vazio é a única coisa que se diz existir naquele lugar.
Ao entrar naquela casa, que por fora lhe chamava a atenção por ser linda e bem detalhada. Sentiu-se como um peixe fisgado pelo anzol ou um pássaro a caminho da arapuca. Mesmo assim continuou sua exploração. Sua razão sabia que não era para ele estar ali, mas depois de passar pela porta principal viu uma escadaria improvável. Acessava os quartos enquanto passeava pelas memórias registradas nas gravuras fixadas pelas paredes. O tapete que cobria os degraus faziam se passar por teclas de um piano embalado pela música de Wagner. As janelas estavam cobertas por tecidos pouco translúcidos que deixavam a luminosidade interior apenas suficiente para não se tropeçar em seus pensamentos confusos. Entretanto, os móveis pareciam ter luz própria. Era fácil navegar por dentro daquele ambiente.
Ele é acostumado a confusões. Mas ao entrar naquela casa percebia o quão normal sua vida era. A casa, como disse, estava deserta. A casa era mesmo assim limpa e com o ar respirável. Mesmo assim não respirava. Pelo menos até o momento em que resolveu subir as escadas. O primeiro lance o levou por entre campos e cidades desconhecidas, mas que já ouvira falar. Cenários parecidos com os seus em tempos infantis. Lá reconheceu suas experiências e pensou que se daria bem naquela exploração. Seu pensamento era singelo e por isso imaginava muito além do que devia.
Quando chegou ao andar superior olhou para cima e viu que entrar ali não teria sido boa coisa. Viu a porta por onde entrara aberta. Ficou curioso como era possível. Explorou o quarto de adolescente que cheirava a morango que estava a sua frente. Entrou no closet arrumado e se perdeu lá dentro entre as calças que deviam ser apertadas e as blusinhas sem mangas. Percebeu então que não sairia de lá, estava em uma espécie de jardim onde as árvores cresciam sem poda e estavam se formando como uma floresta fechada. Resolveu sair depressa e tropeçou no abajur que estava perpendicular à cama. Tentou compreender o que acontecia. Desistiu e foi alcançar as escadas. Lá chegando teve que desviar do lustre de cristal que atravancava o caminho pelo teto. Estava pisando o teto, enrugado pelos degraus, como se estivesse no chão. Procurou encontrar uma forma de sair dali. Percebeu que os lances da escada se misturaram enquanto explorava o quarto adolescente. Viu que já estava à tarde e deveria passar pelo quarto adulto com cheiro de canela.
Em tons vermelhos Ferrari, o quarto estava com sua visibilidade interior comprometida pela fumaça de vários cigarros mal apagados pelos cantos como se fossem incenso. Sobre a mesa um livro de Baudelaire aberto chamava a atenção. Aproximou-se para ler alguns versos. “mon esprit humilié/Faire ton lit et ton domaine;/Infâme à Qui je suis lié/Comme le forçat à la chaîne”. Continuava tentando sair dali. Logo desistiria desse plano, acomodara-se. Agora o cheiro era mais sensual. O clima era mais doce e picante. Em seus lábios um gosto azedo se misturava com um toque úmido que não identificava muito bem. Sabia que era divertido. Seu corpo já não mais respondia a estímulos como antes. Agora era mais rápido e intenso. Estava mais guloso. Sabia o que fazer, mas ainda estava preso. Correu para a escada e subiu até cansar-se. Viu que nunca chegaria a uma saída. Já não era mais o mesmo que entrou naquela manhã. Não era mais curioso. Conhecia muito bem onde estava.
Aquelas memórias grudadas nas paredes foram trocadas. Desta vez todas eram bem conhecidas. Muitas eram manipuladas. Ao final do dia ele encontrou uma velha cadeira de balanço. Aquela tranqüilidade passou a ser seu objetivo final. Arrastou-a até uma janela de vidros sujos que dava para a rua. Estava no 3º andar da casa e de lá podia ver no céu as primeiras estrelas da noite. Sabia que havia entrado em um labirinto digno ao de Dédalo. Não sairia de lá vivo. Mas teve uma boa vida ali. Desfrutou de muitas coisas e compartilhou experiências.
A vida lhe era agora algo passado e bem vivido a sua maneira. Voltaria à luz do que reconhecia ser o seu primeiro berço.

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

Luto



Poucos podem imaginar como foi difícil postar o texto anterior. Poucos realmente podem pensar como foi difícil escrever alguma coisa neste momento infernal. Sinto me atado a escrever algo que não posso, pois não existem termos que possam resumir o valor de uma pessoa. No entanto, sinto que não posso deixar de escrever algo. Hoje/ontem percebi mais uma vez (isso já está ficando repetitivo demais) que a vida é tão passageira. Que de repente nossos amigos se vão e nem nos damos conta. Que quando nos afastamos por causa de nossa “nova rotina” estamos perdendo um tempo valioso que pode nunca mais ser recuperado. Escrevo isso com o coração dilacerado. Não posso dizer que expressão alguma que eu escrever vai demonstrar o que sinto. Também não posso dizer que palavra alguma terá o mérito de contemplar a vida de um amigo que se vai. Não sou arrogante para isso. Mas devo confessar que o medo que sinto é forte e me faz lembrar aquelas palavras tão nobres e repetidas de Vinícius de Moraes que chegam a doer o peito e ferir a alma.
Eu poderia suportar, embora não sem dor, que tivessem morrido todos os meus amores, mas enlouqueceria se morressem todos os meus amigos!

Carine



Ele, um garoto bobo, amigo de um outro bobo, eu, encontrou uma garota legal. Juntos fizeram planos e se casaram. O garoto bobo cresceu, não muito, ficou bobo e fofo. E nessa vida em que as pessoas se perdem em sonhos idiotas, buscando realizações materiais hipócritas ele teve em sua garota legal um norte para não se perder. Ela tinha seu jeito de garota boba, mas decidida como ele também traçou planos e metas. Estavam realizando. Já tinham um bobinho a caminho. Mas algo que não estava em seus planos aconteceu. Agora o garoto bobo está sem sua garota boba e seu bobinho. Ela, especial, foi por outra porta. Pois os planos dEle para ela não eram neste plano. Mas ele não deve ficar só. Estamos aqui para lhe dar todo o conforto de nossos abraços. E assim ele dará novamente seus passos em busca de seu eterno caminho.
Descanse em paz amiga, nós cuidaremos das coisas por aqui.

domingo, 13 de fevereiro de 2011

signo versus ascendente



- Olá.
- Tudo bem.
- Como está a vida?
- Do mesmo jeito, sempre.
- Ainda está se cuidando como antes?
- Um pouco menos, o tempo está acabando.
- Como assim o tempo está acabando? Você ainda está aqui.
- Por isso mesmo, errei nos primeiros cálculos, não sou muito bom em contas.
- Mas era para você perceber que as coisas não aconteceriam daquele jeito. Era para aceitar.
- Não tenho nada para aceitar. E se tivesse não me importaria. Estou apenas esperando.
- É claro que você deve aceitar, deve se cuidar direito. Não é como uma condução que vem.
- Por que não? Desde que chegamos aqui sabemos que ela vem. E a minha não deve demorar.
- Você faz de tudo para ela vir logo né? Não se cuida, não se liga a nada permanentemente. Por isso que ela se foi. Deveria esquecê-la e procurar outra.
- Pura perda de tempo. Assim como esta conversa. Quem é você para me dizer algo. Nem experimenta isto de verdade.
- Através de você. Você precisa de mim. Por isso existo.
- Não vou prolongar este assunto. Tenho que queimar algumas coisas.
- Que coisas? Aquelas lembranças?
- Também, mas vou queimar um pouco de mim, quem sabe assim os outros que ligam deixem de ligar.
- Nossa! Você pensando nos outros.
- Não posso deixar de pensar neles. Me acompanham.
- Você é um covarde.
- Só não quero que tenham trabalho depois, culpando-se.
- Mas eles realmente não têm culpa de nada. Deixe de besteira.
- Não importa. Para mim todos são culpados. Não vou perder meu tempo com eles. Em breve o que espero chegará e deixarei estas baboseiras de lado.
- Você poderia cuidar-se enquanto está por aqui. Eu estou bem, mas é você quem sente as dores. Não eles.
- Mas já está para acabar.
- Você disse isso aos 16 anos, depois aos 19, aos 21, novamente aos 23, quando você quase (...) e agora.
- Quem sabe desta vez eu esteja certo?
- O que você pode fazer para provar?
- Sei que de fato ela deve vir. Posso chamá-la.
- Então por que não faz logo?
- Você ainda está aqui.
- Por pouco tempo. Estou indo com ela.

Não adianta! será?



Não adianta! De fato é impossível. Tento retornar à normalidade, mas não posso. Já fiz tudo que costumo fazer nessas situações, no entanto, nada parece dar certo. Hoje mesmo, fui longe.., tão longe quanto minhas pernas podiam me levar, mas ainda assim não adiantou. Nem aquelas paisagens maravilhosas, nem as dores causadas pela fadiga muscular foram suficientes para poder relaxar a mente. E quem sabe deixar de pensar em você.
Minhas forças físicas esvaíram-se e minha mente está ainda mais enfraquecida. Que tipo de vida é essa? Devia dormir, sinto muito sono afinal, mas sem você ao meu lado a cama fica muito grande. Um deserto gelado. Não sou muito bom em platonismo. Não sei como agir. Estou aprendendo, talvez estarei assim por algum tempo. O melhor que devo fazer é esperar este tempo passar logo. Tudo voltará ao normal. E quem sabe possamos ficar juntos novamente.

"Alto do delírio"




Ultimamente não tenho publicado por falta de inspiração. E para resolver este problema resolvi usar uma técnica muito comum nestes casos: falar de experiências. O problema era escolher sobre que experiência deveria falar. Resolvi então aproveitar o fato de nunca ter escrito sobre uma coisa muito importante para mim e que estava nos meus planos quando decidi criar um blog. Vou relatar um treino de mountain bike que fiz hoje. Treino singular e duro.
Para quem ainda não sabe, eu sou atleta. Sou ciclista e pratico duas modalidades na bicicleta. Faço ciclismo de estrada (speed, bicicleta de asfalto com pneu fino e guidão curvo) e mountain bike (trilha, bicicleta de pneus mais grossos e com amortecedor). Participo de algumas competições e mesmo não sendo tão bom faço parte de uma equipe de uma cidade próxima à minha. Corro em algumas corridas pela região e outras que tenho a sorte de ser convidado. E justamente por causa de uma corrida que terei em breve, hoje fiz um treino especial.
Junto a um colega fui treinar em um lugar muito lindo. Na verdade, hoje vi uma das paisagens mais espetaculares que já tive a oportunidade de contemplar. Geralmente em treinos de subida em mountain bike passamos por lugares maravilhosos, mas não temos cabeça nem tempo para ficarmos olhando. A não ser quando temos algum problema mecânico necessitamos fazer reparos. Na verdade a paisagem que vi hoje foi muito mais do que um belo cenário para cartão postal. Foi um plano de fundo para uma nova visão do mundo. Estava precisando disto. Talvez estava precisando mais daquela paz verde que vivenciei no alto de uma das subidas mais fortes da região do que do treino físico em si.
Ultimamente minha mente anda me pegando peças. Tenho sentido algumas coisas que não são muito comuns. Uns pensamentos estranhos. Umas saudades estranhas. Um vazio sem sentido. E entre uma crise e outra deixo de observar muito o mundo ao meu redor, estou deixando fatos relevantes passarem e acabo me perdendo. Neste momento recolho-me a uma das minhas companheiras mais fiéis, que com a ajuda de minhas pernas me levam o quão longe geralmente preciso.
Mas em dias como este, depois de um treino tão legal, sinto como se minhas forças tivessem voltado. Apesar de ainda ter a mente confusa. Posso mergulhar naquele mar verde no “alto do delírio”(nome da subida, muito apropriado por sinal) rodeado por morros cobertos por uma manta ainda mais verde e escura e deixar-me levar pelo vento e o som dos pássaros que cantavam livremente suas melodias inspiradoras do cerrado.
Desta vez não tirei fotos, mas prometo que em breve voltarei lá e trarei fotos para postar aqui.

domingo, 6 de fevereiro de 2011

Carta



Olá, estou te escrevendo esta carta para te lembrar que hoje é meu aniversário. Sei que já faz muito tempo que não nos vemos, mas acredito que ainda se lembre de mim. Sei que suas ocupações não te permitem visitar velhos conhecidos quando bem entende. Também se vier gostaria que me avisasse com antecedência. Posso estar ocupado com alguma coisa e não sei se te receberei como merece. Ultimamente tenho me lembrado daqueles dias, foram bons os momentos que passamos juntos. Poderíamos revivê-los, pelo menos parte, já que estamos muito atarefados, levando nossas carreiras. Ouvi dizer que recentemente você recebeu uma bela promoção. Vejo que seus esforços daquela época estão sendo recompensados. Sempre soube que teria sucesso. Sempre soube. Disse-te naquela oportunidade que lamentava pelo mau resultado daquela prova, mas hoje acredito que foi bom assim. Você superou todos os desafios e amadureceu bem. Sinto-me orgulhoso por ter feito parte de algum momento em sua vida. Sei que mesmo nestes dias de pressão você ainda se lembra dos momentos em que nos perdíamos em que ensinava ou aprendia. Concordo que errei algumas vezes e que em outras você me tirou do sério com algumas atitudes ingênuas (risos). Nada mais está como antes. Lembra da (...)? pergunta tola. É claro que sim, vocês ainda estão se vendo sempre. Assim que se verem novamente diga que sinto saudades. Na verdade seria interessante se vocês se reunissem e viessem em grupo. Mas como eu disse antes avise-me. É engraçado como a idade me alcançou depressa, não posso mais correr de bike atrás de vocês. Mal saio de casa. Exceto para resolver coisas sérias. Por isso gostaria de rever pessoas que são tão importantes na minha vida. Ah, se você tiver tempo, entre um paciente e outro, escute esta música “There is a light that never goes out” da banda “The Smiths” é antiga, mas gosto muito do refrão.
Atenciosamente, Eu.

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Sonho você



Quando comecei a estudar não tinha a menor idéia dos caminhos e das experiências a que estes estudos poderiam me levar. Como toda criança sonhava em ser piloto, astronauta, policial, agente do FBI e CIA ao mesmo tempo, talvez um James Bond ou um tipo de Batman. Na verdade tive vários sonhos. E ainda os tenho como sonhos. Sei que não se realizarão, no entanto não deixo de nutrí-los todos os dias. Eles são importantes para que eu possa seguir em frente e não pirar. Sonho enquanto trabalho, sonho enquanto pedalo e principalmente sonho enquanto estou com você. Que pode nem saber disso, mas sonho.
Volto a minha realidade. Acordo frustrado, mas quando você está ao meu lado volto mais tranqüilo. Sei nesses momentos que uma parte dos meus desejos esta materializada ao meu lado. Fico feliz. E como se fosse um jogo comigo mesmo escondo esse sentimento ao máximo. Em alguns breves instantes brinco de realizar meus sonhos em segredo, correndo o risco de me revelar. E quando tudo parece perfeito nesse meu universo particular, você me toca. O leve toque de sua pele sobre a minha me faz delirar, naqueles breves instantes minha alma voa, perco o chão, a fala, o sentido de direção e me deixo guiar pela sua voz, pelo seu aroma, pelo seu toque sutil e me embriago em delírios secretos.
Quando nos despedimos, sempre penso que é como num jogo pueril de esconde-esconde. Que quando nos acharmos iremos à loucura de nos (...). Agora vejo que por mais que sonhasse nunca me imaginaria nessa condição. Nada aconteceu de fato como eu queria, mas aceito tudo muito bem, você é um sonho. Ainda reclamo, afinal não sou hipócrita o suficiente para fingir que essa situação em minha vida é a melhor coisa do mundo. Não sei lidar muito bem com meus sentimentos, afinal “sofro desde a epigênese da infância a influência má dos signos do zodíaco”. Sei que há uma boa razão para tudo isso. E se essa razão foi apenas te conhecer já foi muito, desta forma me sinto muito mais disposto a enfrentar o que vier.

Cinema, pipocas, amigos, realidade?



Adoro cinema. A mágica de levar a verdade /  mentira 24 quadros por segundo ao alcance dos olhos. Permitir à mente se entregar completamente à situação da dúvida sobre a realidade dos fatos a tal ponto de penetrar na história defendendo idéias ou circunstâncias fictícias mesmo que por pouco tempo. Melhor ainda quando nos submetemos a este tipo de experiência acompanhados de pessoas que fazem algum sentido em nossas vidas. Adoro a sensação de esquecer tudo o que está lá fora, ou de dissimular que toda aquela representação é uma mensagem apenas para nós. Interpretar as personagens como nossos conhecidos e fazer assimilações exclusivas ao nosso grupo. Sofrer com traumas passados após ver cenas semelhantes às vividas. E principalmente acompanhar tudo isso com muita pipoca e coca-cola.
Sair em plena segunda-feira para ter o prazer de nossa companhia por algumas horas foi fantástico. Receber uma boa notícia entre um filme e outro também foi sensacional, mesmo que esta tenha vindo acompanhada de uma grande decepção que aliviou a alegria sentida naquela noite. São coisas da vida, surpresas que a tornam cada vez mais viciante. Por alguns instantes senti falta de pessoas importantes conosco, mas logo percebi que elas não saiam de nosso meio. Sempre pensávamos nelas. Fato interessante sobre a amizade.
No fim, toda a magia do cinema – dois filmes assistidos – nos embalou as conversas, nos aproximaram mais e nos trouxeram uma boa dose de fantasia. Nem sei se as histórias contadas foram o mais importante, sei apenas que foram um ótimo plano de fundo para um encontro a três que vai deixar saudades. Quem sabe se no futuro esse número se multiplique. Ficarei feliz se a pessoa que não esteve conosco nos acompanhar da próxima vez, assim ela saberá o quanto é amada e o quanto sofremos por seu drama.


Quanto à imaginação e fantasia do cinema sugiro este link para leitura.

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

A deriva



Acho incrível como as coisas têm a capacidade de mudar tão rapidamente. É realmente surpreendente como em apenas 24 horas tudo de mais sólido que havíamos planejado pode se tornar pó. Acontece que tenho lá minhas dúvidas se isso é falta de experiência ou se é porque dou muita importância a meus sonhos. Acredito que não tenho muita sorte também, mas apesar disso continuo me arriscando com meus planos.
Tenho que tomar cuidado todas as manhãs para que minha mente não saia dos trilhos, toda vez após acordar fico na cama fazendo força para discernir o que é realidade do que é ficção, imaginação ou desejo, caso contrário terei grandes problemas. Mas o que acontece é que tento apresentar a realidade como se fosse algo que aceito de fato, e não é. Tento provar para mim mesmo que minha vida está sobre trilhos, mas na verdade é um barco à deriva. Já estou cansado dessa maré infernal que me dá enjôos.
Estou recomeçando uma nova etapa na minha vida. Já estou cansado de tanto recomeçar do zero, desta vez vou carregar comigo algumas lembranças da última. No entanto, quando penso estar tudo decidido percebo que meus planos são realmente como ondas, efêmeros e descontrolados.
Tudo o que sei é que vou seguir meus instintos, se não der certo vou parar de me convencer todas as manhãs e me deixar ser levado pela loucura.

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

[NÃO]Sejamos Moralistas



Por esses dias li um texto com o título de "Sejamos Moralistas" não me lembro aonde, caso o ache outra vez, coloco as devidas referências no fim da postagem. Enfim, o texto me chamou atenção justamente pelo título, tenho uma certa apatia por moralistas, e depois que o li, essa apatia evoluiu para quase um asco. O texto é de caráter irônico, mas descreve verdades indiscutíveis sobre os tais moralistas. Realmente nunca entendi que vontade louca é essa de querer julgar a vida alheia em nome da moral e dos bons costumes, concordo que vivemos um caos, mas não vão ser críticas preconceituosas que vão sanar os problemas da sociedade. Digo preconceituosas pois o tal moralista não faz nada além de ter pré-conceitos sobre tudo e todos, para mim são todos egocêntricos, exaltando o seu eu como modelo a ser seguido. Por que são tão certos da sua verdade? Por que acreditam tanto que a sua tão amada moral é a verdade absoluta e inexorável a ser seguida? Estava reparando que são muitas vertentes de moralistas, mas como isso é possível se a moral é apenas uma? Existem moralistas que criticam homossexuais, e existem moralistas que criticam aqueles que criticam homossexuais, você entendeu? Nem eu. Moralistas religiosos, cada um defende seu caminho, seu deus, sua crença. E onde está a verdade, moral, bons costumes, harmonia, paz e tudo de bom que o termo Moralista anuncia? Não sei como pode haver harmonia com tantas pessoas caminhando em direções diferentes, defendendo o certo e o errado usando da mesma desculpa. Usam o pretexto de serem adeptos à moral para julgar o modo de vestir, andar, falar, os costumes, os medos, e tudo o que não se encaixa em seu falso moralismo. Existe uma maioria hipócrita no universo moralista, que talvez, nem seriam hipócritas se não tentassem ser algo que não conseguem, só para se auto denominarem mensageiros dos bons costumes. Se alguém deseja disseminar uma ideia aparentemente boa, que traga bons resultados não somente para si, mas para outros seres, que faça-o de forma justa, sem julgar, apontar, delatar, com certeza a ideia será mais facilmente aceita. Não sejamos moralistas, não sejamos hipócritas, não sejamos ditadores de uma moral duvidosa, não sejamos injustos.

link para o texto: "Sejamos Moralistas" de Mirlene Souza

Loucura mano!

Bem o vídeo abaixo dispensa qualquer comentário. Apesar de não ser a modalidade que pratico, o que esse cara faz com sua bike me deixa impressionado! É um show de técnica e controle. Já havia postado esse vídeo no meu perfil do orkut, mas agora vou deixá-lo aqui também. espero que agrade.
nota: não tentem fazer isso em casa, na rua, nas calçadas ou dentro da escola. E não, eu nem de longe faria isso rsrsr

Esclarecimento

Por favor meus amigos, não sou contra religião alguma ou satanista. Nem tenho nada contra eles. Apenas sou a favor do esclarecimento religioso e da literatura sem censura. É que existem pessoas hipócritas por aí que pensam que o homem nasceu com um chip programado apenas para um caminho religioso... Eu sei, a bíblia diz isso, mas acredito na livre escolha. Ou será que somos inferiores aos nossos celulares? Eles já são desbloqueados né?

O "evangelismo"


- Mãe, me dá um livro.
- Pra quê? Você nem gosta de ler.
- Quero passar a gostar, dizem que ler faz bem para a cabeça.
- Sabe o que faz bem a cabeça? Deus no coração. Não idéias desse povo que às vezes nem acredita em Jesus e fica colocando coisas estranhas para você ficar pensando.
- Mas mãe...
- Que foi?
- a Senhora não conheceu Deus e Jesus e toda aquela galera através de um livro? A bíblia?
- Humm...
- Qual é o problema de eu ler um livro?
- Porque você pode encontrar outros deuses lá e isso não é bom. Devemos cultuar apenas ao nosso Deus todo poderoso, o criador. Amém.
- Mãe..
- Fala.
- Se ele é o criador de tudo, ele foi criado por quem?
- Você anda lendo o quê por aí? É a internet? Pois a partir de agora o senhor está proibido de usá-la.
- O que faço para ocupar meu tempo então?
- Vou te dar um livro para ler. Criança de 12 anos não deve ficar com a mente tão poluída.
- Legal, ouvi falar de um tal de José Saramago, ele é bom, recebeu prêmios e...
- Não, você lerá a bíblia ou algum livro que fale de Deus.
- o Saramago tem um livro chamado O Evangelho segundo Jesus Cristo.
- É, esse deve ser bom, vai ler esse primeiro. E espero que aprenda algo sobre como é errado questionar a vontade divina.
- Sim mãe, espero que a leitura me salve. (risos escondidos)

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Ventania

Hoje me sinto mais livre que em qualquer dia de toda minha existência. Ando pelas ruas de todas as cidades e todos me cortejam quando lhes dou esse direito. Na maioria das vezes estou invisível, prefiro assim. Gosto de ser voyeur, pois posso admirar solitariamente todas as coisas bizarras que a humanidade costuma fazer, como andar em fila e buscando sua individualidade sendo cada vez mais comum. E se a solidão estiver me entediando logo dou um jeito nisso, chamo qualquer pessoa para ficar ao meu lado, neste meu universo particular.
Não tenho privações. Sou livre de verdade. As correntes morais não fazem pressão sobre mim. Canto como quero, falo como quero e na língua que desejo. Se este planeta me incomoda vou para outro. Saboreio as mais estranhas variedades de comida, todas com alto grau de pureza. Tenho uns problemas para resolver, pois problemas são necessários para se levar a vida. Mas essa vida eu levo ao meu jeito. Sem hora para dormir ou para acordar, sem gravidade para me puxar e sem rumo certo. Por horas posso ficar rodando e vejo as coisas passando como se fossem na janela de um carro de corrida. Imagino-me um pássaro, sobrevôo as nuvens.
Quando estou cansado deito-me no chão e olho para o céu, logo estarei em um deserto, em um oásis e mil virgens estarão ao meu lado fazendo companhia. Serei carregado para meu palácio de cristal onde meus servos, todos feitos de algodão me trarão tudo que preciso. Dormirei e assim sonharei com uma realidade diferente. Lá pessoas me farão perguntas, serei o centro de suas vidas, mas nesse sonho sentirei algumas dores e logo será um pesadelo. Acordarei toda vez que isso acontecer e novamente estarei no meu castelo.
Agora estarei em um campo verde e as formigas estarão comigo. Jogarei batalha naval com os peixes em um lago pequeno que logo transformarei em oceano. Pessoas de todos os tempos virão me visitar, desde políticos importantes a antigos reis poderosos. Prefiro os reis. Eles têm histórias muito mais interessantes para contar. Simulo com eles batalhas épicas e eles sempre voltam para me visitar.
Existe um mundo em miniatura embaixo de nossos pés, em cada molécula, cada átomo é um universo diferente. É ignorância humana pensar que está só neste cosmos. Eu, que estou livre, posso viajar para qualquer lugar, costumo voar nas costas de uma borboleta todas as manhãs e deitar-me com as fadas após suas festas maravilhosas.
Aqui não tenho privações, exceto quando o pesadelo volta e as perguntas e aqueles mosquitos gigantes que jogam veneno em meu sangue vem me irritar. Peço socorro, mas eles estão todos loucos, dizem que me ajudam, mas só me tiram do paraíso.

Confissão

Fui informado que o meu último post era um plágio ( Chat avec le psiquê ). Plagiei inconscientemente o filme 'Ilha do Medo' do Scorcese. Sinto muito por isso já que nesse mundo tudo se cria do nada e eu cometi essa falha de não lembrar que essa história que vinha em minha cabeça se embasava exatamente em outra que havia assistido a algum tempo. É claro que meus milhões de leitores pelo mundo (sic) iriam ficar revoltados então escrevo essa confissão. Peço para que me julguem da forma mais cruel o possível, pois nunca, jamais alguém cometeu algo tão cruel.

Chat avec le psique


- Bom dia Leandro.
- Bom dia doutor
- Leandro, você se lembra o porquê de estar aqui hoje?
- Seria por algo que comi?
- Pare com isso, você lembra onde está a sua família?
- Pelo que me lembro foram tirar férias, mas não sei ao certo onde...
- Quando foi a ultima vez que os viu?
- Ontem mesmo, minha mãe estava cuidando do cabelo de minha irmã.
- Lembra de mais alguma coisa?
- Só que eles não estavam muito satisfeitos, mas por que você está me perguntando essas coisas?
- Por que você não está colaborando comigo.
- Então quer que eu colabore como?
- Apenas me diga o que tem feito nesses últimos dias.
- Tenho feito coisas normais, ido dar minhas aulas, tenho pedalado pouco nos últimos dias, mas tenho jogado muito xadrez com um amigo.
- Quem é esse seu amigo?
- O Carlos, ele é um cara legal... Tem uma loja legal...
- Leandro, tenho que ser sincero com você, você deve saber o motivo que o traz aqui hoje e todos esses dias.
- Qual é então?
- Sua família morreu há cinco anos, ninguém sabe o que aconteceu, te encontraram junto a seus corpos mutilados, aparentemente você estava em choque. Tudo o que queremos é saber o que aconteceu. Aqui é um hospital psiquiátrico, você não tem contato com ninguém exceto comigo há 2 anos, desde quando passou a ser violento.
- Sério mesmo?
- Sim, você tem imaginado tudo... Criado uma outra realidade com personagens e tudo mais. Ninguém conhece a sua família, ninguém realmente sabe de onde veio, porque estão todos mortos, você não tem amigos. Sua mente está doente.
- Se minha família morreu, por que falo com eles todos os dias? Se não tenho amigos com quem jogo xadrez sempre? Se estou preso em um hospício por que saio pelas trilha a pedalar de vez em quando?
- Tudo isso é fruto da sua imaginação limitada à ilusão.
- Se isso tudo é fruto da minha mente “doente”, você também pode ser, assim como todas as outras personagens. Posso simplesmente acordar e voltar à outra realidade.
- Leandro você não está evoluindo no nosso tratamento.
- Não evoluo por quê? Minha mente é livre e você tem inveja, pois vive preso a uma realidade apenas e diz que a minha mente que é limitada.
- Não é isso, você tem que aceitar que sua família está morta e que...
- Mortos para quem? Aquilo só foi um pesadelo, assim como esse.
- Leandro, vamos ter que fazer um tratamento que...
- Então faça logo, já não me importo... Essa conversa nunca existiu mesmo.
- Existiu sim Leandro, aceite a realidade.
- Aceito a realidade que prefiro, me leve de volta o Carlos está me esperando.

"Diálogo"

- Ei, gosto de ti
- Eu também gosto de ti
- Mentira, se tu gostasses de mim saberias que estás a magoar-me todas as vezes que sais com aquele gajo.
- Desculpe-me, mas aquele gajo é meu namorado, saio com ele sempre e ...
- Dissestes que gostas de mim, não me amas?
- Gosto, amar-te já seria demais.
- Mas sabes que sou assim, se falo que gosto é porque amo e se amo quero ter-te como minha namorada.
- Olhe aqui, sou livre, não amo pessoa alguma, apenas as tenho por perto, pois preciso delas. Deixe de ser idiota e passe a ser inteligente.
- Então não amas nem a teu namorado?
- Por que deveria amá-lo, ele atende a minhas necessidades, me acompanha e age comigo de forma a me fazer bem... isso já é o suficiente. Não desejo casar-me com ele, apenas o usarei enquanto me for agradável.
- Tu deverias envergonhar-te.
- Por que motivo?
- Ele te amava.
- Amava?
- Sim, mas agora ele não tem mais coração para isso... Inclusive tinha gosto de frango.

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

"Barbeiro"

O barbeiro Antônio que morava perto da minha casa era conhecido em toda a cidade como o melhor barbeiro da região. Pessoas vinham de todas as cidades vizinhas só para prestigiar seu talento com a navalha. Ele teve uma esposa muito amável que deu a ele três filhas lindas. Infelizmente o barbeiro Antônio teve que criar sozinho suas filhas, já que sua esposa havia falecido por conta de uma inflamação cutânea mal tratada, que também vitimou um vizinho meses antes.
Extremamente religioso Antônio ia sempre à missa de domingo e fazia questão de levar suas filhas junto a ele. Era lá na igreja que o “Tonho”, como era conhecido pelos amigos mais próximos encontrava pessoas diferentes e fazia novas amizades. Coisa rara, já que  era muito fechado e procurava zelar por sua personalidade discreta. Estava quase sempre com o mesmo terno azul marinho, que sua esposa havia lhe dado de presente meses antes de morrer. Cuidava daquele terno como nada na vida, a não ser sua navalha, ferramenta de trabalho. Sempre que o traje se apresentava um pouco descorado ia ao armarinho comprar corante no mesmo tom e tratava de recolorir a peça.
Este presente que tanto cuidava e fazia questão de exibi-lo ao público foi comprado na loja de seu vizinho, o falecido. Sua esposa o havia encomendado e sempre que podia passava na loja para verificar se estava pronto, era muito perfeccionista. Foram cinco meses para a entrega do presente, que não se sabe de quê, já que não era nem aniversário do barbeiro ou qualquer outra data festiva quando foi entregue. Antônio dizia que se tratava da boa fé de sua amada, que tanto o amava a ponto de não haver motivos para presenteá-lo.
Não me lembro muito de sua esposa, eu era muito novo quando ela morreu, mas lembro que era muito religiosa. Apesar disso não freqüentava tanto a igreja quanto seu marido, mas estava sempre rezando. No seu velório as pessoas falavam muito, mas pouco me lembro dos motivos, sei apenas que Antônio não chorava. Ele devia estar conformado com sua fé, já que parecia estar rezando o tempo todo, falando baixinho.
Há cerca de um ano chegou a nossa cidade um circo, o fantástico circo imperial japonês. Foi uma febre, todos iam menos eu. Todas as tardes quando não tinha muito o que fazer e ia jogar conversa fora na barbearia, lá eu ficava sabendo do que acontecia no circo e matava minha curiosidade. Lá também fiquei sabendo do flerte que mudara a vida de Antônio para sempre, pois não era só o circo que viera a nossa cidade naquele tempo.
Lídia chegou na cidade não se sabe de onde, conheceu Antônio na saída da missa de domingo. Chovia muito e por isso o barbeiro lhe deu uma carona até o hotel onde se hospedara. No caminho sua filha menor, um ano mais nova que a do meio e dois que a mais velha, um anjo, a chamou para almoçar com a família. Naquela saia justa causada pela filha o pai não via outra situação se não reforçar o convite. Depois deste vieram outros poucos antes de assumirem o noivado e se casarem rapidamente. Quatro meses depois. Muito se falava sobre isso, mas na época não me preocupava tanto, preferia assuntos sobre bicicletas, dão muito menos trabalho que as mulheres e se nos derrubam as cicatrizes ficam legais para serem exibidas.
Pouco antes de casar, muita coisa já havia mudado na vida de Antônio. Sua barbearia evoluíra completamente, sua aparência seguiu o mesmo caminho. A agora “tony’s barbershop” era referência na região. Até o comércio próximo evoluiu seguindo a tendência e assim todos ganharam. Mesmo quando a concorrência não é pela clientela ela se faz pela atenção. Aquela rua se transformou, a cidade teve que acompanhar e até a administração pública teve que dar seus pulos para acompanhar o progresso.
Mas uma coisa não mudou, seu Antônio continuava usando a mesma navalha de sempre, quanto a isso Lídia não interferira, se preocupava mais em faturamentos e investimentos. Ela dava tanta atenção aos novos clientes que logo era mais popular que seu marido. Já havia até conseguido liberar as três meninas para namorar. E isso aconteceu rápido. Rápido também vieram os problemas, pois agora era muita gente para Antônio barbear. Trabalhava muito, tanto que domingo já não tinha mais ânimo de ir à igreja. Sua navalha começava a reclamar de tanto trabalho e passou a ferí-lo. sede.
Para ajudá-lo Lídia chamou para trabalhar na barbearia um jovem conhecido seu que morava na região, viera logo, mas não adiantou muito, não tinha talento. Antônio devia ensinar tudo a ele, que não saia de sua casa. Acabou mudando-se para lá, a casa ficava atrás da barbearia. Sua nova esposa o tratava como se fosse da família.
Aos domingos as meninas passaram a ir à lagoa da cidade, acompanhadas por seus namorados e sob supervisão de seu pai. Mas o velho Antônio já não agüentava o ritmo imposto por suas filhas e deixou-as sob os cuidados da madrasta. E isso é tudo o que eu fiquei sabendo pela filha mais nova, um primor de garota. Ela disse que o jovem ajudante do pai passou a freqüentar a lagoa aos domingos com a família.
Um dia fui ao “tony’s barber shop”, minha barbicha precisava de reparos, mas não me sentia muito confortável. Seu Antônio não estava com a mesma energia de antes. Tentei puxar assunto várias vezes, mas ele não dava seqüência às minhas frases. Então ele me propôs que eu acompanhasse sua filha mais nova, uma princesa, em uma viagem. Fiquei surpreso, não havia precedente para aquilo e também não entendia o motivo, já que ela tinha um namorado, mais velho, bem mais velho, e além de tudo aparentemente bem de vida, um ótimo partido. Já eu, pobre, magro, ciclista, e feio não tinha predicados consideráveis para aceitar aquela proposta. Mas aceitei. É claro se fosse de acordo com o desejo da filha dele, um desejo.
A encontrei no local, data e hora marcada por Tonho. Ela chorava muito, eu não entendia nada, fui fazer a barbicha e ganhei uma viajem de fim de semana com acompanhante, chorosa, mas era linda assim mesmo. No ônibus me perguntou se eu aceitaria ir com ela para onde fosse para fazer o que quer que fosse. O papo ficou bom. Disse que sim, então ela pediu para descer do ônibus e voltou para casa. E eu atrás. Já era noite. As luzes apagadas. Pediu para que eu não fizesse barulho e me deixou esperando na sala escura. Disse que não queria acordar a família. Eu aceitei.
Sentei-me no sofá. Não via muita coisa a minha frente ou em qualquer direção, apenas brilhos na penumbra. Pouco tempo depois  ouvi passos, falas confusas, gritos sufocados e silêncio. Pensei em ir atrás dos sons, saber o que estava acontecendo, hesitei por algum tempo. Comecei a sentir um frio estranho, meus olhos já se acostumavam com a escuridão, mas mesmo assim não via nada. Tive medo do que podia estar acontecendo e resolvi fazer algo. Agachei-me e pequei um objeto que estava sobre a mesinha da sala. Não segui meus instintos. Queria ter saído daquela casa, mas algo me levava cada vez mais para dentro, parecia que um campo magnético me sugava. Fui tateando as paredes. Abri uma porta pesada de madeira, devia ser bonita, pois senti seus detalhes bem esculpidos. Sobre a cama do casal havia dois corpos nus. Ainda se sentia o cheiro sensual de depravação libidinosa, mas aquele silêncio e frieza gerada pela paralisia dos cadáveres expunham-me a um enjôo eminente. A navalha matara sua sede. Ou não. O quarto ao lado estava vazio, todos estavam reunidos no quarto da filha do meio último do corredor. O pai e as três filhas.
O choro era silencioso convergia à escuridão do lugar. Um pai desgraçado, destroçado e sujo de sangue. Suas filhas se encaravam como em uma despedia. Seu pai, que ignorava minha presença, assim como as outras, confessara sua vingança. Agora a navalha, que se somava a seu braço como a caneta à imaginação do poeta, beberia seu próprio sangue, suas filhas. Primeiro a mais velha, essa era alta, e por isso difícil segurá-la enquanto se debatia como os frangos que via ainda criança ao perderem suas cabeças, mas nesse caso ela seria sacrificada e eu não sabia o porquê. Esvaindo-se em sangue foi sufocada e aos poucos perdendo a força. A do meio ainda estava nua, participou ativa e passivamente da orgia de sua madrasta, essa era mesmo filha de sua mãe, disse o pai antes de atingir sua jugular com sua ferramenta e companheira. Essa chorava, mas não se debateu tanto. Não sei se estava bem amarrada ou o ódio de seu pai a vitimou num instante. Então nesse momento falou com sua filha mais nova, sua flor de lótus. Disse a ela que era pai apenas de uma linda fada. Eu assistia a tudo aquilo com sentimento, mas o frio que sentia me deixava como uma pedra, não entendia nada. Era como se fosse um filme, cinema alemão, mas menos real.
Ela sabia de toda a verdade. Ele levantou a navalha. Ela viu sua mãe morrer. Ele estava ajoelhado a sua frente. Ela o odiava por ser órfã. Ele chorava, mas estava decidido. Ela teceu aquela tragédia. Ele entendia tudo agora. Ela o olhava com desprezo. Ele deu de beber à navalha com seu sangue a última vez. Ela olhou para mim.
Seu pai era alfaiate, ela sabia de toda a história. Desde criança sabia que os fatos a ela apresentados não eram os mesmos que testemunhara em segredo. Com um pouco de influência muda-se o curso da verdade assim como se fosse um rio. Tramou em segredo toda aquela situação, jovem prodígio na arte de tramar. Conhecia seus personagens como peças de xadrez. Jogava com eles visando sua vingança.
Agora eu conhecia a verdade, queria fugir, seu olhar era frio, suas mãos lentas. Apanhou a navalha com lentidão, aproveitava-se de cada segundo. Degustava-os como uma taça de vinho. Sentia um frio no estomago, como se estivesse apaixonado e diante de mim minha musa platônica. E estava. Ela me beijou. Aceitei o destino imposto naquele presente momento. Estava paralisado. Deu de beber à navalha uma vez mais.
30-03-2010