quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Ventania

Hoje me sinto mais livre que em qualquer dia de toda minha existência. Ando pelas ruas de todas as cidades e todos me cortejam quando lhes dou esse direito. Na maioria das vezes estou invisível, prefiro assim. Gosto de ser voyeur, pois posso admirar solitariamente todas as coisas bizarras que a humanidade costuma fazer, como andar em fila e buscando sua individualidade sendo cada vez mais comum. E se a solidão estiver me entediando logo dou um jeito nisso, chamo qualquer pessoa para ficar ao meu lado, neste meu universo particular.
Não tenho privações. Sou livre de verdade. As correntes morais não fazem pressão sobre mim. Canto como quero, falo como quero e na língua que desejo. Se este planeta me incomoda vou para outro. Saboreio as mais estranhas variedades de comida, todas com alto grau de pureza. Tenho uns problemas para resolver, pois problemas são necessários para se levar a vida. Mas essa vida eu levo ao meu jeito. Sem hora para dormir ou para acordar, sem gravidade para me puxar e sem rumo certo. Por horas posso ficar rodando e vejo as coisas passando como se fossem na janela de um carro de corrida. Imagino-me um pássaro, sobrevôo as nuvens.
Quando estou cansado deito-me no chão e olho para o céu, logo estarei em um deserto, em um oásis e mil virgens estarão ao meu lado fazendo companhia. Serei carregado para meu palácio de cristal onde meus servos, todos feitos de algodão me trarão tudo que preciso. Dormirei e assim sonharei com uma realidade diferente. Lá pessoas me farão perguntas, serei o centro de suas vidas, mas nesse sonho sentirei algumas dores e logo será um pesadelo. Acordarei toda vez que isso acontecer e novamente estarei no meu castelo.
Agora estarei em um campo verde e as formigas estarão comigo. Jogarei batalha naval com os peixes em um lago pequeno que logo transformarei em oceano. Pessoas de todos os tempos virão me visitar, desde políticos importantes a antigos reis poderosos. Prefiro os reis. Eles têm histórias muito mais interessantes para contar. Simulo com eles batalhas épicas e eles sempre voltam para me visitar.
Existe um mundo em miniatura embaixo de nossos pés, em cada molécula, cada átomo é um universo diferente. É ignorância humana pensar que está só neste cosmos. Eu, que estou livre, posso viajar para qualquer lugar, costumo voar nas costas de uma borboleta todas as manhãs e deitar-me com as fadas após suas festas maravilhosas.
Aqui não tenho privações, exceto quando o pesadelo volta e as perguntas e aqueles mosquitos gigantes que jogam veneno em meu sangue vem me irritar. Peço socorro, mas eles estão todos loucos, dizem que me ajudam, mas só me tiram do paraíso.

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